Mês: abril 2012

Devíamos invadir a nossa praia

O pessoal da minha geração (e das anteriores) deve ter, como eu, um sentimento de nostalgia com relação à praia do centro de Porto Belo.

Um par de décadas atrás, o trecho de areia entre o trapiche dos pescadores e aquele amontoado de pedras onde havia o marco da Marinha era o lugar preferido para o namoro dos casais.

Caminhar pela praia era o programa romântico daqueles dias (melhor, noites), assim como era comum o pessoal dar voltas por lá, se reunir. Quase um caminho obrigatório antes das saídas de fim de semana.

Lembro disso porque, no meio da semana, percorremos a praia do Centro eu e o Cezinha, nosso grande amigo baixista, em uma corrida noturna (corridas têm se tornado um exercício frequente e bem-vindo).

Praia do Centro: Píer conferiu charme ao local

Constatamos como a praia está agradável, bem iluminada, o píer transformou o trapiche num local charmoso, atrativo. Porém, acho que ninguém em bom juízo se arriscaria a perambular pelo local à noite.

Sim, encontramos gente caminhando e uns garotos sentados numa mureta lá próximo do trapiche das escunas. Mas, fora os garotos, eram pessoas que talvez você preferisse evitar se estivesse sozinho…

Creio que a situação mudaria bastante se ocorresse por aqui o que acontece em Bombas, por exemplo, onde a praia é um espaço familiar, com gente praticando caminhadas, corridas, jogando aquele jogo com discos de madeira que lembra a bocha (se alguém souber o nome, por favor, me avise), entre outras atividades.

Será que o mesmo não poderia acontecer por aqui? Claro, se o Casarão estivesse operando durante a semana (ouvi boatos de que pensam em derrubá-lo, o que seria um crime – aliás, não seria uma ideia nova, já na época do Pirão enfrentamos essa possibilidade, mas é assunto para outro post) seria mais interessante circular por lá, mas creio que poderíamos, muito bem, aproveitar melhor esse espaço público, agora revitalizado, especialmente quando temos tão poucos locais de lazer.

Talvez pudesse haver um pouco mais de segurança e a praia do Centro voltasse a ser o ponto de encontro aprazível que um dia foi. Por que não, então, invadirmos a nossa própria praia?

Alex, um perfil

No último post, conversávamos sobre música. Especificamente sobre o pessoal que fez ou faz a cena musical da cidade. Coincidência ou não, boa parte da turma que citei esteve reunida no Vila Nova para uma celebração surpresa pelo aniversário do Alex, na casa deste, na última terça-feira.

Coveiro, Cezinha, Jefinho, Maninho, o baterista de Itajaí Dunga… não faltou músico na festa (ninguém pensou em uma jam, infelizmente). Outros amigos do guitarrista apareceram e a noite seguiu descontraída.

Já escrevi aqui antes sobre o Alex. Mas gostaria de tirar da gaveta uma entrevista que fiz com ele em 2002, para a Univali. Tinha pensado em usá-la naquela primeira oportunidade, mas o texto foi ficando de lado. Trata-se de um perfil que fiz dele em novembro de 2002, para a Univali.

Alex Sancho: “É hora de apostar”

Perfis são uma das coisas mais legais que se pode fazer em jornalismo. Mas, embora escritos dentro das “técnicas da reportagem”, nem sempre se pode ter certeza de que o retrato ficou fiel ao retratado ou se apenas traduz a forma como a gente vê a pessoa. De qualquer modo, vale arriscar. Segue abaixo o texto:

Não seria muito exagero dizer que, no Brasil, existe um músico ou banda em cada esquina. Fica fácil perceber esta proporção, basta circular por qualquer canto, em qualquer lugar. Na noite, em bares ou boates, em pequenas reuniões de amigos, lá está o violão, ora tocado com talento, ora com mero esforço. Nas garagens os acordes distorcidos perturbam os vizinhos. A caminho do trabalho, alguém cantarola uma melodia.

A música faz parte da vida das pessoas. Cada canção já composta desperta algum sentimento no coração de alguém. Alguns, entretanto, sentem um apelo maior: já não lhes basta apenas ouvir as músicas preferidas, é necessário tocá-las, propor acordes novos, impor um estilo particular às composições, criar as próprias melodias, as próprias mensagens – criar um jeito particular de fazer música. Este impulso, em geral, traz consigo um sonho: o de fazer sucesso e viver da música.

Alex Sancho possui este sonho. Aos 28 anos, contabiliza dez como guitarrista. Atualmente toca na banda Uniclãs, de Porto Belo, no litoral norte do Estado. Prestes a ter nas mãos o primeiro registro em CD oficial da banda, Alex acredita que sua hora chegou.

A Uniclãs é formada por um grupo de amigos que em 2001 reuniu-se para desenvolver músicas próprias, apoiadas nas letras criadas por Nando Kruscinscky, vocalista da banda. O resultado foi tão bom que no mesmo ano o grupo já tocava em bares da cidade. A identificação dos jovens da região com o novo som foi imediata.

“A gente se chocou, a galera gostando e dando apoio. É até absurdo,  porque tem aquela de que santo de casa não faz milagres”, comenta Alex.

No ano seguinte a banda lançou um CD demo, realizou um grande show e vendeu as mil cópias que havia produzido, chamando a atenção do promotor de eventos Juracy de Almeida, da Tâmisa Eventos. No início de novembro, começou a grande guinada.

Por conta de Juracy, a Uniclãs entrou no estúdio Schema 336, em São Paulo, para gravar seu primeiro trabalho profissional, a ser concluído no início de 2003.

A experiência em São Paulo ainda emociona Alex: “Foi um salto, tu ver um músico como o Oswaldinho do Acordeon, tocando ali do teu lado e gostando do teu som, é como um sonho”, empolga-se.

Além de Oswaldinho, outros músicos foram convocados para participar do trabalho do Uniclãs, cujo estilo é uma mistura vários ritmos, do baião ao reggae, com os arranjos marcantes da guitarra de Alex, o baixo de Cesinha, os violões e guitarra de André, a bateria de Guto e o vocal de Nando.

A boa fase da banda é, para Alex, o grande momento de uma trajetória de dificuldades. Canhoto, começou aos 15 anos a tocar violão, invertendo as cordas de um Tonante que comprou com seu primeiro salário como balconista em um bar da cidade. O instrumento ele mantém até hoje, ao lado de uma Washburn, uma Fernandes e uma Guilber, todas guitarras feitas para canhotos.

No começo, a idéia era tirar músicas do Legião Urbana, Titãs e Nenhum de Nós e fazer sucesso nas rodas de amigos e com as meninas. O temperamento tímido, entretanto, o levou ao isolamento. As lições de violão e guitarra passaram a preencher o vazio social na vida de Alex, que varava noites tocando no seu quarto. Tanta dedicação sedimentou uma técnica apurada e o músico passou a ser reconhecido na cidade como um grande talento. Ele, porém, demonstra modéstia: “Me considero, para o padrão da banda, um bom músico. Mas sei que preciso evoluir, tem sempre que buscar uma coisa nova”.

Assim como todos na Uniclãs, Alex não mantém outro emprego. Vive “cheio de altos e baixos”, tocando com a banda ou dando algumas aulas de violão e guitarra. “No inverno é mais complicado, tem mês que toca, tem mês que safa”, conta. Há seis meses conheceu Leydiane Reis Amaral, 20 anos, por quem se apaixonou e hoje vivem juntos, à espera do primeiro filho. “Agora aumenta a responsabilidade”, reconhece.

Ao mesmo tempo, com o casamento veio o apoio e a tranqüilidade para acreditar no sonho: “No começo pensei assim: ‘Se demorar a acontecer, ou não acontecer, vou ter que tomar uma decisão radical’. Mas pintou um lance maior na banda e é hora de apostar”.

Refletindo sobre sua trajetória e a importância da música em sua vida, Alex não vacila em concluir: “Foi fundamental, era o que mais me dava ânimo, em algumas épocas era no que eu mais me apoiava”. Hoje, o guitarrista visualiza a possibilidade de ouvir a Uniclãs tocando nas rádios, subindo em palcos do eixo Rio-São Paulo. Paralelamente, acalenta o sonho de gravar um trabalho instrumental, marcado pelas suas influências de jazz, rock e MPB.

O mais importante, avalia, é fazer daquilo que mais ama um meio de vida: “Agora se abriu um horizonte novo, a oportunidade de conhecer um monte de gente que só ouvia no CD e sendo respeitado por eles. Para o futuro espero que a gente possa estar ainda na música, evoluindo nela e vivendo com dignidade”, conclui.

Memórias do rock portobelense

Uma boa conversa com o André em algum momento vai descambar em música. Boa-praça como poucos, o Coveiro tem me dado o privilégio de acompanhá-lo em suas corridas entre Porto Belo e Bombinhas. E, por sorte, me tem sobrado fôlego para conversarmos em meio ao trote…

Falar de música com o André também desemboca na Uniclãs, banda que volta e meia ensaia um retorno mas esbarra quase sempre na instabilidade do seu frontman, o Nando. Acho que falo com acerto quando digo que a Uniclãs foi o mais bem-sucedido projeto musical de Porto Belo, com CD gravado, shows importantes e fãs fiéis até hoje.

Mais interessante foi saber pelo André que a Nosferatu deu uma pequena parcela de contribuição na caminhada da Uniclãs. Nosferatu foi um projeto de curta duração, creio que pouco mais de um ano, que nasceu lá pelo final de 1994. Não tínhamos composições próprias, mas fizemos uns bons shows no Palco das Artes e alguns outros divertidos no Job’s – o Job sempre tinha sua casa, lá no Vila Nova, aberta para nossas apresentações – sem contar um que terminou em pancadaria lá em Itajaí…

Nosferatu em ação no Palco das Artes de 1995 (foto: Luiz Dadam)

Realmente, nesses shows em Porto Belo a gente via o pessoal que depois faria a Uniclãs e também formaria a atual cena musical da cidade: lembro do Nando subindo no palco na primeira noite que tocamos no Palco das Artes, para terror do seu futuro empresário Juracy, do Carlinhos atento ao meu vacilante contrabaixo no Job’s, sem falar do Alex, na ocasião a guitarra canhota da própria Nosferatu (que se completava com o André Tulipano e o Henry).

CENA QUENTE

Nossa banda talvez ficasse mesmo num meio-caminho entre as primeiras experiências musicais na cidade de que eu me lembre e a Uniclãs. De primeiras experiências me refiro, por exemplo, à Distrito, banda do pessoal de Bombas, Márcio, Luisão e Ita, que tocava no Casarão em frente ao Trapiche dos Pescadores (foi lá que eu os vi, pelo menos), muito antes que houvesse aquela sucessão de bares no centro, primeiro Cais entre Nós, depois Bodega do Porto, Bucaneiro, Caída da Lua e, enfim, Canoa Quebrada, os quais fizeram o nome de gente como Serginho Almeida (outra importante referência musical da cidade), Seco, a Estatura Mediana de Itajaí e outros.

Numa garagem quase em frente ao Caída da Lua, aliás, saiu uma experiência musical que, ao menos para mim, serviu de referência: ali ensaiavam o Vilsinho, Juliano e Testa, com o propósito de formarem uma banda com influências no punk rock. Soube que tocaram uma vez no Submarino Amarelo, e só.

Disso tudo surgiu a Nosferatu, depois que o André saiu brigado de uma banda que havia em Itapema decidido a formar a sua própria banda de rock. O período era marcado ainda pelo sucesso do Álbum Preto do Metallica e pelos ecos do grunge encabeçado pelo Nirvana e seu Nevermind – ambos os álbuns lançados em 1991. Ensaiamos no mais absoluto improviso na casa do Alex (que antes tocava com o Bicudo, Christian e Jefinho), até encontrarmos o Henry, baterista de Itajaí, que nos abrigou em sua bela casa no bairro São Vicente.

Nosso primeiro show ocorreu dia 14 de janeiro de 1995, no ginásio Gabriel Colares, em Itajaí. Tocávamos somente covers, não entramos no estágio das composições próprias. No verão seguinte, às voltas cada um com suas próprias preocupações, deixamos o projeto esfriar. O André depois formaria a Steel Warrior, em Itajaí, banda que obteve contrato com gravadora e alguns shows na Europa. O Alex seguiu tocando com o pessoal daqui e se juntou à Al-Jihad do Nando e do Maninho, o que viria depois a ser a Uniclãs.

Guardadas as proporções, sinto um pesar semelhante ao do pessoal da Uniclãs pelo fim prematuro da Nosferatu. Daqueles tempos, herdei uma obsessão pelo contrabaixo que ainda não se reverteu em domínio desse instrumento. Ficou também o gosto pelas mesmas músicas. Apesar de tudo, acho que posso compartilhar com o pessoal da Uniclãs e de outras bandas que pipocaram (pipocam) na região, o sentimento de que valeu a pena. Enquanto durou, foi excelente.

Alcides Mafra

Hora do rush

Faz um tempo, antes ainda do verão, esperando por uma carona para Balneário numa segunda-feira pela manhã, me dei conta de algo que os mais observadores devem ter reparado muito antes: como anda confuso o trânsito em Porto Belo! Caótico talvez seja o termo mais correto…

O que antes era exclusividade dos meses de verão parece estar incorporado à nossa rotina, ou seja, trânsito lento no centro, especialmente nas chamadas horas de rush. Na manhã em que tive a minha “revelação”, fiquei surpreso com a quantidade de veículos transitando pela Irineu José Moreira logo pela manhã: ônibus de estudantes, caminhões e mais carros de passeio, numa confusão de ir e vir, estacionar, manobrar para dar passagem ao outro etc.

Alcides Mafra

A razão principal para isso, creio, está na atual facilidade para se adquirir um carro ou moto. Basta lembrar que, há uma década e pouco, eram raros os meus amigos que possuíam veículos. Hoje, difícil é ver uma família que não tenha pelo menos um na garagem. Motocicleta, então, quase todo rapaz ou moça hoje em dia dirige uma.

Trânsito complicado é quase sempre problema para quem, justamente, não dirige. O pedestre precisa estar atento e seria muito bom que, de parte a parte, passantes e motoristas, usassem com mais frequência e observassem as faixas de pedestre.

Por outro lado, existe a dificuldade com os passeios. Raras são as calçadas que possuem rampa, circunstância que agora, pilotando um carrinho de bebê, verifico com mais precisão, muitas são esburacadas e muitas mais simplesmente, inexistem. E há o problema da superpopulação de postes na avenida: como comparou muito bem dona Lúcia Japp, a principal via parece um “paliteiro”.

Ocorre que, com a cada vez mais comum presença dos navios de cruzeiro em nossa orla, a população pedestre na cidade aumenta bastante em determinados dias. Contingente que, em boa maioria, é formado por idosos.

Se por um lado há mais carros na pista, por outro há mais gente circulando nas calçadas. E estas, definitivamente, não comportam nem atendem adequadamente ao público. Creio que está aí um ótimo tema para os postulantes ao próximo mandato municipal terem na agenda.

Arão Mafra Filho

A Paixão sem farra

Amanhã será a Sexta-feira da Paixão e permanece a calmaria das últimas semanas. Para quem, nos últimos anos, acompanhou o auge e a agonia da farra do boi, quando esta virou caso de polícia, parece que temos, como diria Nelson Rodrigues, “um silêncio de mil catedrais”. Claro, tudo pode acontecer de hoje até domingo.

No entanto, parece realmente que a farra está sepultada. Houve casos isolados, repreendidos com brutalidade até. As próximas gerações, muito provavelmente, saberão dessa tradição só de ouvir falar.

Acho que já comentei por aqui, mas lembro com saudade do tempo em que, ainda garotos, acompanhávamos a farra por trás das janelas gradeadas lá da casa da minha mãe. Empoleirados no sofá, eu e os irmãos lutávamos contra o sono, espiando a rua vazia e escura, ouvindo o rumor da conversa dos adultos na esquina e os ecos distantes distantes do pessoal que “brincava” com o boi.

Se tivéssemos sorte, o animal passaria correndo feito uma assombração defronte nossos estarrecidos olhos. Talvez víssemos mesmo o espetáculo do boi lançando adiante algum farrista mais ousado.

Mais tarde, já maiores, junto com os outros garotos, pudemos “correr atrás do boi”. Devidamente paramentados (bermuda velha por cima de uma calça de moletom, outro moletom amarrado atravessado no peito e kichutes), ficávamos pendurados nas árvores, esperando o grande momento da “soltada”, lá onde hoje está o mercado do Romilton. Foi quando surgiram as primeiras lendas, com a do Jackson que, dizem, subiu num espinhento pé de “mamica-de-porca para escapar do boi. A árvore, testemunha silenciosa da veracidade ou não do “causo”, não existe mais  – seu Zé Antônio a derrubou.

Arão Mafra Filho

Depois vieram os mangueirões, as carreiras pela cidade, as semanas inteiras de soltadas que paravam as aulas no Tiradentes, caminhões boiadeiros em comboio pela cidade. Mais tarde, com a proibição, tudo foi se acabando.

Abandonei cedo a farra, primeiro por covardia, depois por desgostar da tradição. Não há como negar, é uma prática violenta. Depois de adulto, ainda participei de algumas, pois toda a turma queria ir, não havia jeito. O encanto, porém, já havia passado.

Nos tempos de Pirão, cobrimos algumas vezes a farra do boi. A proibição era assunto recente e a revolta dos farristas contra a imprensa, em especial, era enorme. O Candôco corria um especial perigo, pois, como fotógrafo, era a parte mais visível do “inimigo”. Uma foto memorável daquele tempo (preciso achá-la nos arquivos do jornal) foi tirada em Canto Grande. Um caminhão passava na avenida com um bando de farristas em cima. O boi não se via.

O Candôco subiu num muro e conseguiu fotografar o animal deitado amarrado no fundo da carroceria, congelando na imagem também as expressões de raiva e ameaça dos farristas. O jeito foi sair de lá rapidinho.

No Pirão, creio que exercíamos uma espécie de autocensura com relação à farra. Lembro de um editorial que escrevemos, no qual defendíamos a tradição, mas dávamos razão à proibição  – ambiguidade maior, impossível. Ou seja, saíamos pela tangente, embora nem, eu nem o Luiz fôssemos a favor da “brincadeira”. No fundo, é algo parecido com o que ocorreu até há bem pouco, quando políticos locais defendiam e até incentivavam a prática, pois não queriam ficar mal com seus eleitores.

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