Seu Arão e Carlinhos improvisando um som: “Eu já fiz quatro gols!”

Nestes tempos de jogadores de futebol mimados e técnicos sem pulso firme, vale se mirar no exemplo do seu Arão, o técnico que mais vezes comandou o Cervejas em seus quase vinte anos de existência.

Admirador do delegado linha-dura Antônio Lopes, meu pai não dava moleza: esbravejava com o time o jogo inteiro e infernizava os juízes. Porém, profissional que era, depois do jogo pedia desculpas aos apitadores e dava risadas com a gente.

Nas “resenhas” antes das partidas, meu pai sabia como ninguém simplificar a estratégia e motivar a rapaziada:

– Aqui não tem ninguém melhor do que ninguém, é tudo homem – costumava dizer.

Faz algum tempo que o seu Arão deixou de comandar o time, por conta de suas funções como vigia da Prefeitura, mas ainda acompanha os jogos quando pode e ainda fica doente com as vaciladas do Cervejas.

Lembro que nem mesmo o primeiro goleador que o Cervejas conheceu teve vida fácil com meu pai.

Carlinhos (o da Bodega do Porto) estava especialmente inspirado durante um jogo do terceiro campeonato que disputamos. Creio que foi na temporada de 1996. Foi no verão após terem dragado parte da praia do centro, para lá do rio que delimita o Baixio. Naqueles anos, o campeonato de futebol de areia era disputado nos domingos à tarde, não havia iluminação. Por causa da subida da maré, não terminou ali – o campo teve que ser mudado novamente para o Baixio.

Pois bem, enfrentávamos o time do Besc e o jogo estava realmente equilibrado. Não sei se num momento em que o Carlinhos perdeu uma bola, meu pai esbravejou:

– Calinho, seu m….! Não tás fazendo p… nenhuma!!!

No que o Carlinhos, em tom de desculpa, arrematou:

– Mas seu Arão, eu já fiz quatro gols!

De fato, os quatro gols do empate contra o bom time do Besc.
Num jogo seguinte, contra o Hora Certa, Carlinhos não teve o mesmo brilho. Depois de tropeçar na corda que delimitava o campo de jogo, ele caiu dentro d’água. Na saída, num impulso, tirou a camiseta encharcada. Tonho do Zeli, o juíz, não perdoou e expulsou o Carlinhos. Tomou um jogo de gancho por atitude antidesportiva.

Carlinhos continuou jogando no Cervejas mais algumas temporadas. Mas ele brilhava especialmente nos jogos comemorativos que promovíamos, os chamados Cervejas x Ressacas (o Ressacas era um combinado veterano de parceiros do Cervejas). Ao mesmo tempo, sua Bodega do Porto se tornou passagem obrigatória após cada jogo disputado. A casa sempre recebeu o time muito bem, mesmo depois da maior traição que poderíamos cometer: comemorar nosso melhor resultado em campeonatos, o vice de 2006, em outro boteco.