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Como fazer um jornal chapa-branca – II parte

O amigo Aristides lembrou, nos comentários, de um adjetivo muito usado nos círculos “administrativos” naqueles tempos do Pirão, não sei se popular ainda hoje: cola-branca. Também não sei se exclusivo daqui ou se usado em outros lugares – imagino que sim.

Cola-branca servia para designar o sujeito que não gozava de muito prestígio entre os mandatários do município. Por exemplo, se alguém fosse até a prefeitura para reivindicar algo, porém não fosse do partido assentado no poder, assim que saísse de lá teria seu pedido desconsiderado da seguinte maneira: “Esse é cola-branca!”. Ou seja, poderia esperar sentado pela solução.

Assim, cola-branca era o cidadão da oposição, o “do contra”. Como, durante sucessivas administrações, Porto Belo esteve sob comando do mesmo grupo político, filiado a siglas como PDS e PFL (hoje PP e DEM, respectivamente), a oposição, representada pelo PMDB, incorporou por muito tempo o papel de cola-branca.

Quando o PMDB finalmente assumiu o poder, em 1993, passou a pecha aos adversários.

Mais adiante, criamos no Pirão, em nossa seção de charges, uma tirinha cujo personagem era o Cola-branca. Tentamos brincar com o absurdo e a conveniência que era para os administradores se livrar de questões importantes apenas atribuindo o rótulo de cola-branca a quem exigisse seus direitos. Mas não creio que tenhamos conseguido transmitir a mensagem que desejávamos.

A questão é que, assim que saiu a primeira edição do jornal, em plena corrida eleitoral, estávamos sofrendo certa crise de identidade perante a classe política local. Para a desconfiada oposição, capitaneada pelo PTB e PPB, éramos sem dúvida um jornal chapa-branca. Já a situação não digeriu muito bem o fato de termos destacado na capa o vice-candidato dos opositores (não tínhamos uma foto do vice do PMDB. Por outro lado, sobrava espaço e não sabíamos como fechar a capa), nem o fato de termos coberto o lançamento da campanha e observado o evidente clima de racha que havia, fruto de uma convenção um tanto traumática para o partido, constatação que dividimos com os leitores.

Para a situação, estava claro: éramos colas-brancas.

Como fazer um jornal chapa-branca – I parte

Li em algum lugar que Joseph Goebbels, o ministro da propaganda de Hitler – de sinistra memória – dizia algo parecido com isto: “Uma mentira dita mil vezes se torna uma verdade”.

Não sei se acusaram a gente de ser “um jornal do PMDB” mil vezes, mas falaram o suficiente para que tivesse quem acreditasse e a gente precisasse trabalhar muito a cada edição para desfazer a falsa impressão. Claro que, em algumas ocasiões, contribuímos para que a “maldição” persistisse…

Acho que quem teve a ideia de fundar o jornal foi o André. Pelo menos, foi de sua boca que eu ouvi pela primeira vez sobre isso. Conheci o André depois que saí do Maré Mansa, um informativo bancado pelo então prefeito de Porto Belo, Sérgio Biehler. Saímos eu e o Roberto de Souza, o Piva, do Maré Mansa (saíram conosco, na verdade) e aceitamos o convite para trabalhar com o principal inimigo político do nosso antigo patrão, no caso, o Etevaldo Santana, um jornalista que tinha dois jornais, um em Bombinhas e outro em Porto Belo, e aprontava horrores – contra seu desafeto e contra a língua portuguesa também.

Lá no Maré Mansa surgiu, praticamente, um time de futebol que deu o que falar, depois batizado de Cervejas. Mas essa é outra conversa…

O André trabalhava com o Etevaldo, no escritório do piso superior da rodoviária de Porto Belo, e também fazia frila para O Atlântico, então comandado por um sujeito chamado João de Deus. Mais tarde, eu e o André decidimos trabalhar em sociedade, diagramando jornais da região. E, mais tarde ainda, incluímos o Luiz Dadam (Candôco) nessa sociedade, abrindo juntos uma empresa para dar aulas de informática. O plano parecia excelente, não houvesse aparecido uma concorrente melhor habilitada que pôs tudo a perder…

André morava em Itajaí, mas vivia mais tempo em Porto Belo, visto que tinha noivado aqui e tinha seus frilas na cidade. Guitarrista de uma banda de Itapema, depois ele teve outra ideia interessante: a de montarmos uma banda de rock. Disso nasceu a Nosferatu, mas isso também é papo para outra oportunidade…

Devia ser abril ou maio de 1996, ano de eleições municipais. André achou a ocasião perfeita. Nenhum de nós era jornalista, mas tínhamos trabalhado com jornais desde Navegantes até Governador Celso Ramos, o suficiente para acreditar saber como fazer. Mais importante: achávamos poder fazer melhor. Na verdade, queríamos entrar com tudo na campanha, promovendo entrevistas, fazendo pesquisas de opinião, enquetes com temas importantes, que pudessem nortear a corrida eleitoral. No papel, tudo certo…

Ideia aceita, havia duas decisões importantes a tomar. A primeira delas, lógico, era dar nome ao jornal. Promovemos um “brainstorm”, André, eu e o Luiz. Sentados em volta da escrivaninha do escritório que havia sido do Etevaldo, lá no piso superior da rodoviária, tratamos de lançar nomes. Mil “gazetas” disso, “folhas” daquilo e mais um monte de bobagens que usávamos para aliviar a seriedade da coisa – escolher nome de jornal não é muito fácil…

Um dos nomes que foi dito de brincadeira foi “Pirão d’água”. Quem disse? Não sei, talvez o Candôco saiba, mas desconfio que tenha sido o André. Mesmo que fosse para ser piada, o nome começou a fazer sentido quando o associamos a essa coisa de valorização da tradição local, algo que queríamos incluir na linha editorial. Parecia, portanto, senão uma boa escolha, ao menos a melhor que tínhamos no momento.

A segunda providência era conseguir um jornalista responsável. Ou seja, alguém com diploma, amigo nosso e que topasse fazer isso na camaradagem. O único com esse perfil que conhecíamos era o Vadão. Problema: ele era então secretário de Esportes da prefeitura de Porto Belo, portanto vinculado à campanha eleitoral. Ainda assim, parecia a melhor (senão, a única) opção, pois era alguém conhecido e confiável, então valia a pena tentar. Vadão topou na hora, não impôs nenhuma condição e ainda aceitou ajudar escrevendo sobre esportes, assunto que ele realmente domina e aprecia. Assim, era pôr mãos à obra e lançar na rua a novidade.

Nem imaginávamos a encrenca em que estávamos nos metendo…

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